A NATUREZA DO MINISTÉRIO CRISTÃO E SUA RELAÇÃO COM A PALAVRA

 

INTRODUÇÃO

 

            Sem dúvida, “Liderança e Ministério” têm sido dois dos temas mais debatidos e abordados em todos os tempos – em especial em nossos dias -, não somente em âmbitos eclesiásticos, mas em todas as esferas da sociedade e da vida humana, uma vez que em todas as áreas se requer líderes. Muitos são os livros e artigos escritos que buscam estabelecer diretrizes, tornando-se balizadores para uma Liderança eficaz com vistas os resultados.

O tema que abordaremos diz respeito à Liderança Cristã e ao Ministério Cristão – com ênfase no ministério pastoral – e por mais que tenhamos bons livros sobre o assunto naquilo que chamamos de “mundo secular”, nosso maior exemplo é Cristo, e nossa fonte de pesquisa é a Bíblia Sagrada. Portanto, toda análise que faremos tem como base as Sagradas Escrituras e como padrão ideal, o Filho de Deus.

O que caracteriza um verdadeiro ministério cristão? Quais as marcas de uma Liderança Cristã verdadeiramente bíblica e confirmada por Deus? Qual deve ser a postura de um pastor frente aos desafios da atualidade?

Estas e muitas outras perguntas norteiam os desafios da Liderança Cristã deste tempo. Com base nisso, buscaremos respondê-las tendo a Palavra de Deus como única base. Sendo assim, abordaremos primeiro sobre o verdadeiro propósito do Ministério Cristão, em seguida trataremos acerca disso marcada pela excelência, e, finalmente, buscaremos entender um pouco mais sobre o seu exercício com base no Princípio da Autoridade.

Conforme notaremos, todos estes pontos culminarão no cumprimento do ministério cristão na exposição e compromisso com a Palavra de Deus.

Ao final de nossos estudos, desejamos que Deus, por meio da ação inigualável do Espírito Santo aplique em cada um de nós o seu propósito e que sejamos transformados de tal forma que nos aproximemos ainda mais daquilo que Deus deseja para todos nós.

 

 

 

CAPÍTULO I

 

A NATUREZA E A DESCOBERTA DE UMA VOCAÇÃO[1]

 

            O pastor e teólogo Sinclair Ferguson afirmou acertadamente: “No Novo Testamento uma das mais frequentes descrições do crente, em uma única palavra, é ´chamado´”. Em primeiro lugar o cristão é chamado para ser discípulo de Jesus, e nesta condição, ele é chamado a servir a Cristo com seus talentos.

A descoberta deste chamado é, sem dúvida, uma questão vital na vida de todo cristão, principalmente porque, em certo nível, disso depende sua satisfação interna. Conforme veremos, a descoberta e a potencialização da vocação é algo enfatizado na Palavra de Deus, que trata disso de forma clara e contundente.

O objetivo aqui proposto é o de lançar luz no caminho daqueles que buscam ter maior clareza sobre a sua vocação e contribuir com aqueles que desejam potencializar o exercício do seu ministério. Para isso, dois pontos centrais serão abordados, sendo eles: 1) Desperte o dom que há em ti; 2) A vocação e sua natureza.

 

Desperte o dom que há em ti

 

            “Por este motivo eu te exorto que despertes o dom de Deus, que há em ti…” (II Tm 1.6).

Estas célebres palavras de Paulo são carregadas de significado, importância, assim como verdadeira e pura paixão. É possível identificar grandes verdades na admoestação do apóstolo ao jovem obreiro Timóteo, tratando-se, inclusive, de uma grande oportunidade de se aprender acerca da importância da descoberta da vocação e sua potencialização.

 

Ampliando a compreensão do texto

            O aprendizado de princípios bíblicos depende direta e essencialmente de uma correta compreensão do texto sagrado, e para isso é fundamental uma correta interpretação dele. Por esta razão, aqui será feita uma análise específica e objetiva das palavras de Paulo a Timóteo, tendo como objetivo principal a extração de lições fundamentais sobre Vocação e sua descoberta.

 

Argumento de Paulo

            Observe que a exortação de Paulo começa com a expressão “por este motivo”, e isto é extremamente significante. Ao usar esta expressão, o apóstolo está firmando sua ordem sobre um argumento. Qual seria o argumento?

A resposta a esta pergunta encontra-se nos versos anteriores, nos quais é possível identificar as razões pelas quais Timóteo deveria obedecer a ordem paulina, conforme seguem-se: 1) Timóteo estava sendo lembrado e ao mesmo tempo alertado a respeito de sua trajetória; 2) ele estava sendo conscientizado de que sua fé e sua relação com Paulo não era mera coincidência, mas tratava-se de providência divina, como meio de preparar todas as coisas necessárias para o cumprimento do seu chamado; 3) a necessidade de despertar o dom que havia nele era um dos fundamentos básicos para o sucesso de sua carreira ministerial.

 

Algumas considerações ampliadas sobre o texto

Depois de apontar a razão que levou Paulo a exortar Timóteo sobre a necessidade de despertar sua vocação, enfatizaremos alguns pontos (ampliados) relacionados ao texto que podem auxiliar para uma melhor compreensão nesse estudo.

  • Esta carta é destinada a um jovem vocacionado ao ministério com a finalidade de resolver questões pessoais e ministeriais
  • Conforme visto, Paulo ordenou que Timóteo despertasse o dom que nele havia com base na história e em sua fé
  • De acordo com as palavras de Paulo, não tinha razão para que Timóteo não cumprisse sua vocação, uma vez que Deus o havia escolhido e dado a ele condições de fazê-lo
  • O apóstolo apresenta algumas verdades sobre a chamada de Timóteo: a) ela é santa; b) ela não procede da carne; c) ela é um propósito divino

 

A vocação e a sua natureza

O sucesso de qualquer empreendimento ou projeto não é acidental, mas depende diretamente de fatores imprescindíveis a ele. Uma boa e pura motivação, metas bem traçadas e objetivos claros e alcançáveis são vias que rumam ao êxito de qualquer trabalho. Entretanto, no topo da lista está o poder da descoberta do propósito da vida, isto é, da vocação, porque, é a partir disso que todos os demais passos deverão ser dados, caso contrário, a caminhada será sem direção e sem foco.

A esta altura surge uma dúvida: “Por que devo Descobrir minha Vocação”?

Essa pergunta é central e vital, pois além de dar direção, ela também auxilia na busca de se encontrar as motivações em um determinado empreendimento. E, por falar em motivação, destaca-se a importância de se lembrar que o sucesso de qualquer empreendimento depende diretamente de suas motivações.

Uma motivação errada é capaz de levar qualquer projeto – por maior e mais excelente que possa ser – ao fracasso, pois o dia que essa motivação for frustrada, a ruína está configurada e estabelecida. Nesse caso, a melhor e mais segura fonte é a Bíblia e é para ela que se deve olhar com a finalidade de detectar o que se deve aprender sobre a motivação de uma vocação e como reavaliá-la.

 

A visão de Deus sobre a Motivação

            Estaria Deus preocupado com as motivações de um vocacionado? As motivações de um obreiro são capazes de agradar ou não a Deus? As motivações de uma pessoa chamada ao ministério são realmente importantes para Deus?

O ponto de partida aqui é considerar que toda essa análise tem de ser feita à partir de Deus e não do homem, isto é, é preciso partir do princípio de quem é Deus. Nesse caso, atentar para o que diz a Palavra de Deus em Hebreus 4.13-12:

Pois a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração.

E não há criatura encoberta diante dele. Todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele a quem havemos de prestar contas.

 

A ênfase desses dois versos recai sobre o poder de Deus em ver tudo e de Sua Palavra de revelar o que está na mente e a intenção do coração. O escritor afirma que nenhum ser está fora do olhar do Criador e que todas as coisas, isto é, tudo o que envolve a criatura, também é conhecido dele.

Fica claro que aquilo que move alguém a realizar determinada coisa para Deus em seus mais variados aspectos possui elevado valor. Conclui-se que, mais importante do que simplesmente realizar algo para Deus, é preciso reavaliar – com o auxílio do Espírito Santo – as intenções do coração, isto é, a motivação.

Para uma compreensão maior e ampliação do entendimento sobre isso, é preciso uma leitura atenta e reverente dos textos de I Coríntios 4.5 e 13.3, respectivamente:

Portanto, nada julgueis antes do tempo, até que o Senhor venha, o qual também trará à luz as coisas ocultas das trevas, e manifestará os desígnios dos corações. Então cada um receberá de Deus o louvor.

E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para o sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria.

 

A Vocação e sua Natureza

            Não se pode negar ou fazer “vista grossa” à dificuldade que existe na descoberta de uma vocação. São incontáveis o número de pessoas talentosas, possuidoras de extraordinários dons naturais e até espirituais que, em resultado a esta dificuldade, reduzem-se a uma vida superficial e sem profundidade.

Quantos talentos desperdiçados! Quantos dons não utilizados! Quantos vocacionados estagnados! E tudo isso por falta de autodescoberta, e, geralmente, porque realmente não é tarefa fácil descobrir a própria vocação!

A principal dificuldade para a descoberta de uma vocação repousa sobre a sua natureza, isto é, de onde ela procede. Portanto, tendo em vista vencer e superar essa dificuldade, o primeiro e principal passo a ser dado é identificar a fonte de toda vocação, e desta forma, será possível vencer todas as dificuldades nesta direção.

 

Deus é a fonte de toda vocação

            O pastor e professor Hermisten Maia afirma:

Numa época de crise política, econômica e moral, como a nossa, uma das coisas difíceis e ao mesmo tempo necessárias de se fazer, é planejar. As incertezas aumentam. Tornamo-nos mais suscetíveis a imprevistos externos que determinam mudanças em nossa rota, daí a insegurança. Portanto, muito do que planejamos permanece apenas no campo ideal, não podendo ser concretizado ou adiado… Em um mundo de incertezas, próprias de nossa condição de criaturas frágeis, podemos ter uma convicção que emana da Palavra: Deus nos chama eficazmente por Sua livre vontade e graça.

 

Ao somar o que se tem estudado até aqui com o texto supracitado, é possível identificar com clareza a real e imensurável distância entre Deus e os seres humanos, o que se dá em todos os sentidos, afinal de contas, Ele é o Criador Todo Poderoso, e os homens são apenas criaturas limitadas. De uma maneira bem específica, o texto de MAIA acentua a limitada capacidade humana em planejar alguma coisa, mas que esbarra na sua incapacidade de controlá-las, eliminando a certeza de que as coisas sairão conforme o planejado. Conclui-se, portanto, que as limitações e a incapacidade humanas em alcançar o padrão ideal de vida são inerentes ao ser humano, e só mesmo pela graça é que Deus pode se inserir e usar alguém nessas condições em Sua obra (II Co 12.9).

Sendo assim, o homem é incapaz de promover a sua própria vocação, ou ainda, a sua chamada para o exercício ministerial. Isso quer dizer que é Deus quem vocaciona e chama pessoas para o trabalho em Sua obra. Diante disso, ressalta-se que, embora as ações resultantes de uma vocação ou de uma chamada ocorram dentro das relações e dimensões humanas, a vocação é estritamente divina, pois procede de Deus.

 

Vencendo a dificuldade

            A distância entre quem vocaciona (Deus) e o vocacionado (homem) é, sem dúvida, o maior obstáculo a ser superado na trajetória rumo à descoberta e potencialização da vocação. Todavia, esta dificuldade pode ser vencida por aqueles que, com determinação e perseverança, buscarem desenvolver um relacionamento constante e saudável com Deus.

Buscar a Deus é o caminho para a descoberta da vocação, e de sua potencialização, conforme as palavras do pastor Dave Harvey:

Há outro lugar, muito mais importante, onde devemos começar: Deus. A chamada ao ministério diz respeito ao caráter e à atividade de Deus, à sua misericórdia e amor e, em última análise, à sua provisão para aqueles pelos quais Cristo morreu. Se a iniciativa daquele que chama é tudo, então, temos de nos preocupar com o Chamador Supremo!

 

O caminho que conduz à descoberta da vocação passa pela estreita e difícil, porém prazerosa avenida da comunhão com Deus. Negligenciar a comunhão com Deus nesse processo é ter a garantia da frustração e da decepção. Há muitas passagens bíblicas nas quais há advertência sobre a necessidade e a importância de se buscar a Deus em todo o tempo (Is 55.6; I Ts 5.17); e, conforme se vê, disso depende a descoberta da vocação, não podendo ser uma ação isolada, mas sim de uma vida inteira.

 

 

CAPÍTULO II

 

LIDERANÇA COMO MINISTÉRIO

 

A cruz estabelece não somente o que devemos pregar, mas também a maneira como pregamos. Ela prescreve o que os líderes cristãos têm de ser e como devem ser vistos pelos membros das igrejas. A cruz nos diz como servir e nos atrai a prosseguir no discipulado, até que entendamos o que significa ser cristãos transculturais.

 

  1. A. Carson

 

            Vivemos em uma sociedade hierárquica, isto é, marcada pelo conceito dos poderes concedidos a alguns e a subordinação exigida de outros. Esta realidade se reproduz inclusive no seio da igreja, em suas mais variadas formas e áreas, e isto resulta em duas situações, uma positiva e a outra negativa, como vemos: a positiva diz respeito à ordem que é preciso ter quanto à condução da igreja em sua esfera humana; já a negativa está na tendência de haver separação de classes, uma vez que no corpo de Cristo, todos somos iguais em importância e essência.

Nesse caso, para que haja equilíbrio entre as partes, a Liderança Cristã precisa estabelecer prioritariamente Cristo como padrão a ser seguido para uma Liderança verdadeiramente Cristã. Um líder espiritual deve evitar ao máximo padrões humanos e seculares no exercício de suas funções eclesiais, como afirmou John MacArthur:

 

É um engano sério para cristãos em posições de liderança terem mais interesse com o que é atualmente popular no mundo empresarial do que com o que nosso Senhor ensinou sobre liderança.

 

Se Cristo é o padrão ideal de Liderança na igreja, qual o verdadeiro sentido de exercer esta função para Deus? Como a Bíblia apresenta a função de líder? Qual a natureza de uma verdadeira Liderança Cristã?

Algo muito comum, e extremamente prejudicial à saúde espiritual da igreja, é a ideia equivocada sobre o verdadeiro sentido de ser um Líder no contexto espiritual, pois, em linhas gerais, é comum haver uma separação entre os que exercem liderança e os que são tidos como liderados. Este comportamento é fruto de uma concepção que diverge totalmente dos princípios bíblicos e cristãos, por esta causa, é necessário que seja revisto o papel e o lugar da Liderança Cristã dentro do plano de Deus para a humanidade por meio da igreja.

Do ponto de vista bíblico, o exercício de Liderança na igreja é apresentado como Ministério. Por isso, é preciso atentar para o verdadeiro sentido de Ministério, reavaliando urgentemente seu significado e implicações.

Há muitas referências no Novo Testamento referindo-se ao ministério, e sempre denotando a ideia do serviço (I Co 4.1 e At 26.16). Nestes dois casos a palavra é oriunda do termo grego huperetes, remetendo-se literalmente ao ato de servir ao outro, e nada além disso.

Numa avaliação particular do texto de Paulo aos irmãos que estavam em Corinto, é possível perceber claramente que o assunto é sobre liderança, e o apóstolo coloca esta função como ministério, ou seja, na concepção bíblica, liderar é servir. MacArthur nos auxilia mais uma vez, ao escrever:

 

De acordo com Cristo, então, o mais verdadeiro tipo de liderança requer serviço, sacrifício e abnegação. Uma pessoa orgulhosa e que se promove não é um bom líder de acordo com o padrão de Cristo, independente de quanta influência ela teria. Líderes que olham para Cristo como seu Líder e seu modelo supremo de liderança terão corações de servos. Eles exemplificarão sacrifício.

 

Numa análise bíblica, principalmente neotestamentária, Liderança não constitui uma classe especial dentre os demais, e nem tampouco, elitista; pelo contrário, Liderança diante de Deus é serviço prestado a Ele e ao Seu povo. Como escreveu D. A. Carson:

 

O que significa ser um ministro de Cristo é estar obrigado a promover, por palavras e exemplo, o evangelho do Messias crucificado.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO III

 

EXCELÊNCIA NA LIDERANÇA

 

Você somente fará a diferença quando viver em um padrão mais alto que os outros; portanto, você precisa elevar os seus padrões a novas alturas a cada dia. Seus padrões não apenas o transformarão – mas também tocarão e transformarão a vida daqueles que estão perto de você.

 

Robb D. Thompson

 

            Há um padrão bíblico para o exercício da Liderança Cristã, e este padrão possui um nível altíssimo, principalmente porque encontra-se sobre fundamentos espirituais, e não meramente humanos. De início, é importante ressaltar com base no capítulo anterior que, o padrão mais elevado desta Liderança Espiritual é  o serviço, ou seja, ela verdadeiramente atingirá seu padrão ideal quando estiver nesta direção.

Além disso, existem outras exigências qua a Bíblia expõe para aqueles que exercem funções ministeriais e de liderança na igreja. O que de fato é excelência ministerial do ponto de vista bíblico? Quais as marcas de excelência para uma Liderança Cristã?

Nos moldes mundanos e seculares, o sucesso de um líder é medido pelos seus resultados somente, e, geralmente seus princípios, motivações e critérios não são avaliados e nem tampouco considerados. Entretanto, não estamos tratando de mera liderança humana, mas daqueles que são chamados por Deus para conduzir Seu povo na direção que o glorifique.

Poderíamos elencar muitas marcas que evidenciam uma Liderança excelente, contudo, apresentaremos apenas três que servem como verdadeira base para todas as demais.

 

Dimensão espiritual

 

            Por mais que lidere homens em seus dramas e problemas diários, os que servem a Deus e conhecem Sua Palavra, não podem incorrer no gravíssimo erro em pensar, e principalmente estabelecer princípios humanos para o exercício de sua Liderança. Consideremos o que o pastor John MacArthur tem a nos dizer:

 

Todo líder que também é um cristão – incluindo o gerente de qualquer fábrica, o treinador de futebol e o professor do jardim de infância da escola pública – precisa se lembrar que o papel da liderança é uma responsabilidade espiritual, e as pessoas que lideramos são uma responsabilidade recebida de Deus para a qual seremos um dia chamados a prestar conta (cf. Mt 25.14-30).

 

Podemos perceber que, ao tratar do tema de Liderança Cristã, estamos falando de vontade e propósito de Deus, portanto, os padrões têm de ser de acordo com o de Deus, logo, trata-se de padrões espirituais. Por esta razão, o Líder Espiritual precisa ter hábitos que o conduzam para perto de Deus, a fim de que possa não somente conhecer, mas principalmente ser capacitado pelo Espírito Santo a cumprir esses padrões.

 

Dimensão do caráter

 

            Biblicamente falando, liderar está mais ligado ao caráter do que ao estilo ou às técnicas. É tendência do ser humano se apegar a métodos que estão “funcionando” em determinados lugares e sob a liderança de algumas pessoas, fazendo deles seus próprios métodos; entretanto, o Líder verdadeiramente chamado por Deus deve submeter tudo isso aos padrões bíblicos, pois os mesmos estão mais ligados à sua natureza (caráter) do que propriamente dito, em seus resultados.

 

Robb Thompson contribui mais uma, ao afirmar:

 

É a profundidade e a força do seu caráter, o que determina a altura que a sua vida pode alcançar… O nosso caráter diz aos outros exatamente quem somos e qual papel desempenhamos na vida. O caráter simboliza os valores morais e os princípios distintos que regem as nossas decisões. Trata-se dos atributos mentais e morais que definem quem somos. O bom caráter se refere à virtude, à autodisciplina e a uma constituição honrosa, denotando grande força moral.

 

Dimensão da influência

 

            No próximo capítulo trataremos direta e mais profundamente sobre “Princípios de Autoridade”, todavia, adiantando um pouco, é preciso considerar que um verdadeiro Líder é marcado por sua capacidade de influenciar pessoas, não por imposições, manipulações ou meras recompensas externas, mas pela autoridade que envolve a capacidade de exemplo justo.

Ao possuir esta capacidade, o Líder não somente influencia seus liderados, como também se torna uma fonte de inspiração, como observamos nas palavras de MacArthur:

 

Um verdadeiro líder inspira seguidores. Alguém que não tem seguidores dificilmente pode ser chamado de líder… Para dizer isso de maneira simples, a liderança é influência. O líder ideal é alguém cuja vida e cujo caráter motivam as pessoas a seguirem seu exemplo.

 

Somente um Líder que possui fundamentos espirituais e de caráter que conseguirá efetivamente influenciar outras pessoas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPÍTULO IV

 

PRINCÍPIO DE AUTORIDADE

 

A maior das exigências que Deus faz ao homem não é a de carregar a cruz, servir, fazer ofertas, ou negar-se a si mesmo. A maior das exigências é que obedeça.

 

Watchman Nee

 

            É impossível tratar sobre Liderança e não tocarmos no importante, amplo e complexo tema da Lealdade e Deslealdade que é vinculado ao Princípio de Autoridade. Portanto, encerraremos nosso estudo abordando sobre este princípio considerando principalmente o que as Escrituras têm a nos dizer.

 

Leal ou Desleal?

 

            Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti: que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste.

Jesus (Jo 17.21)

 

            Procurando guardar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz. Há um só corpo e um só Espírito, como também fostes chamados em uma só esperança da vossa vocação; um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos vós.

Paulo (Ef 4.3-6)

 

            Nesta primeira parte avaliaremos os dois lados do tema abordado: Lealdade e Deslealdade. Caminharemos no sentido de verificarmos principalmente a forma com que a fidelidade e a infidelidade pode influenciar o andamento da igreja e também a forma com isso pode contribuir com a influência diante do mundo.

Observaremos ainda como a Lealdade e a Deslealdade podem vir a ser conhecidas, isto é, os meios pelos quais ambas podem vir a se manifestar.

 

Uma triste realidade

 

Nada é mais trágico do que uma igreja dividida!

Esta tragédia não diz respeito apenas ao círculo dos crentes em si, mas também para o mundo, e isso por duas razões básicas: 1) desagrada a Deus; 2) impede do mundo reconhecer Cristo como o enviado de Deus.

É preciso saber que a igreja sempre estará aquém do púlpito, isto é, o nível espiritual é determinado pelos obreiros que a lideram. Sendo assim, a unidade da igreja depende diretamente da forma com que os obreiros lidam com o tema da fidelidade a Deus e às autoridades espirituais estabelecidas por Deus.

Quando o assunto é qualificações ministeriais, a Bíblia é exigente e o crivo é seleto e apertado. Sem dúvida, as exigências ministeriais expostas por Paulo em suas cartas a Timóteo e Tito sinalizam para uma série de condições que, dentre outras funções, separa entre os verdadeiramente chamados por Deus dos que apenas se auto nomeiam obreiros (I Tm 3.1-16; Tt 1.5-16).

Paulo ainda exorta a igreja que estava em Corinto, dizendo sobre a necessidade vital da fidelidade de um líder (I Co 4.2).

A fidelidade é fundamental a um líder, principalmente porque este um dos atributos comunicáveis de Deus, e como exemplo, aquele que exerce função eclesiástica (oficial ou não), deve servir de exemplo aos fiéis, inclusive no que diz respeito à fidelidade.

 

Fidelidade posta à prova

 

            Lealdade é uma daquelas coisas que sua realidade é demonstrada principalmente por meio de reações, ou ainda, ela não é provada por palavras, mas por meio de atitudes e obras que a caracterizam. Portanto, é importante observar que a fidelidade se desenvolve e se manifesta em ambientes específicos, e a Bíblia relata esta verdade, e por isso passaremos a avaliar esta importante parte deste estudo.

 

Do ponto de vista bíblico, a fidelidade é posta à prova em dois aspectos básicos: ambiente favorável e ambiente desfavorável.

 

Ambiente Favorável

 

Há uma ideia equivocada de que o maior teste do crente se dá em tempo de escassez ou de dificuldades, entretanto, de acordo com a Palavra de Deus, a fidelidade de alguém é colocada à prova em todos os instantes, inclusive em tempos favoráveis. Para uma compreensão ampliada leiamos Filipenses 4.11-13.

Paulo é claro ao sinalizar a necessidade que temos de aprender a lidar com todas as possibilidades, sejam favoráveis ou desfavoráveis, ou seja, tanto em uma situação como em outra, é fundamental ter estrutura para vivê-las (Rm 8.37-39).

Analisando o contexto é possível perceber os apontamentos feitos por Paulo para situações negativas e de adversidades agudas como incapazes de separar alguém do amor de Deus, mas nestes versos ele aponta para situações mais positivas e favoráveis também como insuficientes para anular este amor. Portanto, é possível perceber que na concepção de Paulo, situações favoráveis e desfavoráveis são igualmente meios pelos quais se prova a fidelidade de alguém a Deus e à sua liderança também.

Geralmente, a fidelidade de alguém é testada em oportunidades irresistíveis e únicas. É preciso muita atenção às oportunidades que surgem, pois quase que em todos os casos, os grandes erros ocorrem em situações semelhantes a estas.

Minha fidelidade a Deus e à liderança estabelecida sobre mim, sempre será testada em terrenos aparentemente banhados das “bênçãos” de Deus. Em situações como estas o que deve prevalecer é a valorização dos princípios internos e bíblicos, considerando sempre o todo e não somente a parte, isto é, considerando o propósito, e não apenas aquele momento.

Usando o exemplo dos discípulos que, de acordo com as palavras do próprio Jesus, foram leais a Ele no pior momento de sua vida (Lc 22.28,29), o pastor Dag Mills afirma: “a lealdade é mais apreciada nos momentos críticos. Nos bons momentos, todos parecem leais”.

 

Ambiente Desfavorável

 

Uma outra forma que a lealdade é testada se dá em tempos de crise, de escassez, de dúvidas e descrédito. Até onde vão nossas raízes? Estamos bem firmados em nossas convicções e resoluções? Somos de fato fiéis a Deus e aos nossos líderes espirituais?

Perguntas como estas só poderão ser verdadeiramente respondidas em tempos difíceis e áridos. Paulo é exemplo nisso, conforme lemos em II Timóteo 4.9-16.

Quando escreveu estas palavras, Paulo estava preso e consciente de que não sairia dali com vida, pois seria decapitado como mártir. Humanamente falando, ele se encontrava em posição de fraqueza e vergonha, tratando-se de um ambiente totalmente propício para que os infiéis se revelassem como tal.

O que encontramos no relato de Paulo é uma lista de pessoas que o abandonaram no momento que ele tanto carecia de pessoas ao seu lado, carência demonstrada ao pedir que Timóteo o atendesse rapidamente. O que se conclui é que, geralmente um ambiente desfavorável é usado como meio de colocar a fidelidade de alguém à prova.

Em conclusão, afirmamos que uma verdadeira Liderança Cristã deve seguir padrões espirituais que visam sempre o serviço a Deus e ao próximo. Além disso, a excelência de um ministério consiste principalmente na obediência que por sua vez é um princípio inegociável estabelecido por Deus.

 

 

REFERÊNCIAS

 

CARSON, D. A. A Cruz e o Ministério Cristão; São José dos Campos: Fiel, 2018.

MACARTHUR, John. O Livro sobre Liderança; São Paulo: Cultura Cristã, 2009.

THOMPSON, Robb. Excelência no Caráter; Rio de Janeiro: Central Gospel, 2010.

HARVEY, Dave; Eu sou chamado? A vocação para o ministério pastoral; Editora Fiel; São José dos Campos – SP 2013

THOMPSON, Robb; A arte da Distinção; Editora Central Gospel; Rio de Janeiro 2013

COSTA, Hermisten Maia Pereira; A Vocação Cristã; Paraíba do Sul – Conferência Edificar 2015

[1] Esse conteúdo tem como base a obra “Vocação: Descobrindo o seu Chamado” deste mesmo autor, publicada pela Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD), com primeira edição em 2020.